Saudade

A vivência da saudade é uma sensação curiosa: começa por ressoar incessantemente, como um grito desesperado, para depois se ir atenuando devagar, sem nunca desaparecer completamente.
Primeiro é um nó na garganta, uma tontura, uma inquietação persistente, como a abstinência de uma droga deliciosa. Depois é um peso no peito, uma memória, um desejo oculto que nos persegue no subconsciente.
Quando deixa de gritar ao ouvido, a saudade passa a aparecer nas esquinas dos momentos, entre um pensamento e outro, num sonho, numa lembrança, num local.
Passa a ser a recordação de um cheiro, do toque, das mãos quentes, do beijo forte. Passa a ser a vontade de voltar atrás no tempo, de agarrar de novo os momentos, de reincidir uma e outra vez, sem medo. Passa a ser a idealização de algo que se desmoronou, sem razão ou com todas as razões do mundo.
Na continuação dos dias transforma-se numa companhia silenciosa, quase confortável, afagando as tristezas quotidianas com gotas de uma cumplicidade passada, que talvez nunca mais se repita.
Permanece a secreta vontade do regresso, guardada num cantinho da alma, uma promessa por cumprir que aguarda o momento de regressar à superfície numa conquista triunfante, vencendo o tempo, o mundo, a adversidade e as expectativas.

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