Felizes para sempre

Quando o casamento acabou e tu fazias as últimas despedidas, eu agarrei a última orquídea branca da mesa nupcial e fugi pelas portas entreabertas do salão.
Cá fora a lua cheia ia alta, gigante testemunha da minha pequena fuga, derramando um luar ténue e cúmplice sobre as águas calmas da piscina.
À minha volta os arbustos erguiam-se como fantasmas, em estranhos recortes nocturnos, transformando aquela cena inusitada em algo sombrio e melancólico.
A mão, coroada enfim com a dourada aliança do compromisso, caminhava em minúsculas marés sobre a superfície da água. O vestido, antes imaculado, cobria agora o relvado húmido sem que eu me importasse. Todo aquele cenário era um fulgor refrescante depois do dia abafado, fútil e ardiloso que ali se findava, a flor amachucada na minha mão morrendo comigo, pétala por pétala, exalando o seu último odor de liberdade.
No âmago de mim, como um trovão de culpa insuportável, gerou-se o desejo de deslizar na margem de pedra áspera e inalar com todas as forças a água amarga e fria da piscina. No meu pequeno delírio, a minha alma imortal sobrevoava o cenário idílico por ti imaginado, paraíso de cisnes e cascatas de champanhe, e fixava o corpo inerte e flutuante, maravilhoso vestido de cauda ensopado cobrindo o centro daquela mentira.
Quando por fim se ouviu o ruído das portas de correr e o eco dos teus passos convictos no caminho calcetado eu acordei do meu sonho mórbido e fixei o meu olhar preto de mágoa em ti. Irrepreensível na tua postura de estátua grega, não revelaste um segundo de surpresa por me ver assim, despojada de toda a vergonha, semi-deitada entre os nenúfares e as colunas jónicas.
Seguraste a minha mão com firmeza e eu segui os teus passos, submissa, relembrando os motivos de todo aquele teatro de princesas, a aliança pesando toneladas no meu dedo fino, as lágrimas contidas na caixa do meu peito, guardadas para um dos raros momentos de solidão.
Atrás de mim, os arbustos riam e balançavam ao sabor do vento e o despojo da orquídea navegava de forma caótica, afundando por fim, sem hesitação, como uma consciência pesada.

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